sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Súmula Vinculante n° 8 do STF e multas por descumprimento de obrigação acessória

O Supremo Tribunal Federal, como já é de conhecimento geral, decidiu pela inconstitucionalidade dos artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que alargaram para 10 anos o prazo para que a Administração Pública lance e execute as contribuições previdenciárias. Tal decisão motivou a edição da Súmula Vinculante nº 8, que assim prescreve: “São inconstitucionais os parágrafo único do artigo 5º do Decreto-lei 1569/77 e os artigos 45 e 46 da Lei 8.212/91, que tratam de prescrição e decadência de crédito tributário”. Logo, o prazo para lançamento e execução das contribuições previdenciárias é de 5 anos, conforme estabelecido pelo Código Tributário Nacional.
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A Secretaria da Receita Federal do Brasil vem cumprindo a decisão do STF e tem determinando administrativamente a baixa das autuações realizadas com base no art. 45 da Lei n° 8.212/91, inclusive dos débitos que já estão inscritos em dívida ativa.
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Apesar disso, uma questão vem chamando a atenção: a posição da Fazenda Nacional no sentido de que a Súmula Vinculante n° 8 do STF aplica-se apenas à obrigação principal, não se estendendo às multas decorrentes do descumprimento de obrigações acessórias, cujo prazo para lançamento permaneceria sendo 10 anos.
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Tal posição não se sustenta. As obrigações acessórias ou deveres instrumentais são instituídas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos e tem por objetivo tornar possível a realização da obrigação principal, propiciando ao ente tributante a verificação do adequado cumprimento da obrigação tributária. Esta é a previsão do art. 113, § 2°, do Código Tributário Nacional:
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Art. 113. A obrigação tributária é principal ou acessória.
(...)
§ 2°. A obrigação acessória decorre da legislação tributária e tem por objeto as prestações, positivas ou negativas, nela previstas no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos.
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Como se vê, as obrigações acessórias não têm outro escopo que não o de amparar uma obrigação principal que, em matéria tributária, é o pagamento do tributo. Nesse sentido, a fiscalização por parte das autoridades administrativas do cumprimento de obrigações acessórias (p. ex., exibição de livros fiscais, apresentação de declarações - GFIP...) só se justifica se proporcionar à autoridade fiscal os meios necessários à fiscalização de recolhimentos a cargo do contribuinte e ao lançamento de eventuais valores devidos.
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Veja-se, qual a razão lógica, por exemplo, de se verificar livros fiscais relativos a período em que as contribuições previdenciárias não poderão ser lançadas, pois abrangidas pela decadência (Súmula Vinculante n° 8 do STF)? A toda evidência, não há resposta plausível para tal questão, na medida em que não está o contribuinte obrigado a manter e apresentar documentos relativamente a períodos acerca dos quais não há mais crédito tributário a ser constituído. Logo, o descumprimento de tais obrigações jamais poderá ensejar a aplicação de multa.
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Além disso, a obrigação acessória não cumprida convola-se em obrigação principal, nos termos do art. 113, § 3°, do Código Tributário Nacional, autorizando o Fisco a inscrever a multa e cobrá-la por meio de execução fiscal. Ora, se o principal, no caso as contribuições previdenciárias, tem prazo decadencial de cinco anos, não há motivo para se estabelecer o prazo da obrigação acessória em dez anos. Sem sombra de dúvidas, aplicável é a máxima de que "o acessório segue o principal".
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Dessa maneira, não se legitimam as multas aplicadas pelo descumprimento da obrigação acessória em período superior a cinco anos.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

PIS - Não-incidência sobre a receita das empresas que não possuem empregados

Uma tese bem interessante, que pode causar sensível economia tributária, mas pouco comentada, é aquela que defende a não-incidência do PIS sobre a receita/faturamento das empresas que não possuem empregados. Tal tese pode ser utilizada por pequenas empresas que não optaram ou que estão impedidas de optar pelo Simples Nacional, especialmente aquelas tributadas com base no lucro presumido (ex. pequenas sociedades de profissionais habilitados como escritórios de advocacia, imobiliárias...).
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Com efeito, a contribuição para o PROGRAMA DE INTEGRAÇÃO SOCIAL – PIS foi instituída pela Lei Complementar n.º 7, de 7 de setembro de 1970, com a finalidade de promover a integração do empregado na vida e no desenvolvimento das empresas, conforme seu art. 1º.
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Com a promulgação da Constituição Federal de 1988 e por expressa disposição do seu art. 239, passou a financiar o programa do seguro-desemprego e o abono aos empregados que percebessem até 2 salários mínimos na remuneração mensal.
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A cobrança do PIS, portanto, fundamenta-se na presença ou não de empregados. Se a empresa não possui empregados, não está obrigada ao pagamento deste tributo.
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Assim vem decidindo o Superior Tribunal de Justiça, na forma do seguinte precedente:
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TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PARA O PIS. AUSÊNCIA DE EMPREGADOS. FATO GERADOR.
1. A contribuição para o PIS tem como fato gerador a admissão de empregados pela empresa. Inexistindo, ocasionalmente, empregados, não é devida a exação em debate.
2. Recurso especial provido. (REsp 493001/RS, STJ, Segunda Turma, Relator Min. João Otávio de Noronha, julgado em 23/05/2006, publicado em 14/08/2006)
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Logo, as empresas que não possuem empregados, podem, por meio de ação judicial, obter o reconhecimento do direito de não recolher o PIS, enquanto perdurar essa situação, bem como de repetir/compensar os valores indevidamente recolhidos a este título.

segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Instrução Normativa n° 900: mantida a vedação de compensação de contribuições previdenciárias com outros tributos administrados pela Receita Federal

No último dia 31/12/2008, foi publicada a Instrução Normativa n° 900 da Secretaria da Receita Federal do Brasil, que disciplina a restituição e a compnesação de quantias recolhidas a título de tributo administrado pela Secretaria da Receita Federal do Brasil, bem como a restituição e a compensação de outras receitas da União.
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A publicação de tal ato estava cercada de grande expectativa, na medida em que iria regulamentar os procedimentos de compensação após a criação da Secretaria da Receita Federal do Brasil (SRFB), que englobou as funções da antiga Secretaria da Receita Federal e da Receita Previdenciária. Muitos esperavam que tal instrução trouxesse autorização expressa para que pudesse o contribuinte, através de declaração própria, compensar débitos de contribuição previdenciária com créditos de outros tributos administrados pela SRFB.
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Até então, os débitos de contribuições previdenciárias poderiam ser compensados com outros tributos administrados pela SRFB somente após prévio pedido de restituição ou ressarcimento dos créditos pelo contribuinte. Realizado tal pedido, antes de restituir ou ressarcir a quantia, a SRFB verificava a existência de débitos de contribuições previdenciárias e realizava a compensação, conforme art. 7°, do Decreto-lei n° 2.287/86, com a redação que lhe foi atribuída pela Lei 11.196/05. Esse procedimento foi denominado de "compensação de ofício", uma vez que realizada diretamente pela Administração. Não havia a possibilidade de o contribuinte efetuar tal compensação por vontade própria.
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Salvo melhor juízo, a IN n° 900/08, como não poderia ser diferente, manteve a vedação e os procedimentos anteriores. O seu art. 34 é claro ao excluir da compensação realizada mediante declaração de compensação do contribuinte as contribuições previdenciárias:
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Art. 34. O sujeito passivo que apurar crédito, inclusive o reconhecido por decisão judicial transitada em julgado, relativo a tributo administrado pela RFB, passível de restituição ou de ressarcimento, poderá utlizá-lo na compensação de débitos próprios, vencidos ou vincendos, relativos a tributos administrados pela RFB, ressalvadas as contribuições previdenciárias, cujo procedimento está previsto nos arts. 44 a 48, e as contribuições recolhidas pas outras entidades ou fundos.
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Em que pese opiniões em sentido contrário, entendemos que a parte final do dispositivo acima citado é claro a excluir daquela sistemática as contribuições previdenciárias, que seguem regra própria de compensação, disposta nos arts. 44 a 48 da mesma instrução normativa. Ademais, tal possibilidade demandaria a edição de lei em sentido formal autorizando essa compensação, o que no caso inexiste. Aliás, há expressa vedação a tal compensação no art. 26, parágrafo único, da Lei n° 11.457/07. Portanto, interpretar a IN n° 900/08 em sentido diverso do que aqui exposto importaria violar os princípios da legalidade e da hierarquia das leis.
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Não desconhecemos a situação atual de diversos contribuintes que titulam vultoso débito de contribuições previdenciárias e elevado crédito de outros tributos que não podem ser utilizados para amortizar tal dívida via compensação, especialmente os exportadores. Aliás, defendemos ferranhamente a necessidade de legislação que propicie a compensação de contribuições previdenciárias com créditos, por exemplo, de PIS, COFINS, IRPJ, CSLL etc. No entanto, sem maior segurança não podemos afirmar que a IN n° 900/08 assim autoriza, sob pena de gerar novo passivo tributário.
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Assim, até que seja editada lei autorizando a compensação de contribuições previdenciárias com créditos de outros tributos administrados pela SRFB ou que a própria SRFB manifeste-se por essa possibilidade, não aconselhamos que os contribuintes realizem tais compensação.

segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Transferência de saldo credor: inconstitucionalidade e ilegalidade do cronograma de utilização dos créditos

Muitos contribuintes no Estado do Rio Grande do Sul que adquiriram saldo credor acumulado de ICMS de outros contribuites sediados no Estado têm sido surpreendidos com a fixação de cronograma para utilização dos créditos adquiridos por parte da Fazenda Estadual, ou seja, a administração estabelece uma data a partir da qual o crédito poderá ser aproveitado. Ocorre que, muitas das vezes, a Fazenda estabele um prazo superior há um ano da data da autorização de transferência para que o saldo possa ser utilizado pelo adquirente. Exemplo: a Secretaria da Fazenda autoriza a transferência do saldo credor em 01/2009, mas autoriza o seu aproveitamento pelo adquirente apenas em 03/2010.
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Tal prática tem por fundamento a nota 06 do número 2 da alínea "d" do parágrafo 2° do art. 37 do Regulamento do ICMS (Decreto n° 37.699/97), que tem a seguinte redação:
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NOTA 06 - A Receita Estadual, com base no valor mensal que será autorizado para a utilização pela totalidade dos recebedores dos créditos transferidos nos termos do art. 58 informará ao contribuinte no documento de Autorização de Transferência de Saldo Credor o cronograma de utilização dos créditos recebidos por transferência, no qual constarão os períodos de apuração e os respectivos valores que poderão ser utilizados, para que redução do imposto devido em cada período, devendo ser obedecido, cumulativamente, pelo contribuinte, o disposto nas demais notas deste número quanto aos valores máximos de utilização desses créditos naquele período.
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Essa disposição regulamentar tem gerado uma série de prejuízos aos contribuintes: os que adquirem o saldo credor acumulado ficam impedidos de aproveitá-lo imediatamente, sendo que provavelmente já despenderam valores na sua aquisição; aos que transferem o crédito, a impossibilidade de fazerem novas transferências, pois ninguém, em sã consciência, adquirirá crédito que somente poderá ser utilizado um ano depois, tanto mais na atual crise financeira de liquidez.
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Contudo, tal cronograma é inconstitucional e ilegal, razão pela qual pode ser questionado judicialmente. Primeiramente, porque a Constituição Federal assegura o aproveitamento integral dos créditos de ICMS, sendo que a fixação de cronograma equivale a vedar o aproveitamento, pois, como referido, nenhuma empresa adquiriá saldo que não pode ser utilizado de imediato. Segundo, porque inexiste previsão legal autorizando o cronograma. Muito antes pelo contrário. A transferência é garantida pelos arts. 22 da Lei Estadual n° 8.820/89 e 3°, inciso II, e 25, § 1°, incisos I e II, ambaos da Lei Complementar n° 87/96. Logo, a previsão regulamentar afronta o princípio da legalidade e da hierarquia das leis, na medida em que apenas a lei emanada pelo Poder Legislattivo pode inovar a ordem jurídica instituindo nova obrigação, situação com a qual não se confunde o Decreto assinado pelo Governador do Estado.
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Portanto, os contribuintes que têm enfretado tal problema podem, por meio de ação judicial com pedido de liminar, postular o afastamento do cronograma de aproveitamento do saldo credor acumulado recebido em transferência.